O evangelicalismo como força agonística: disputas hegemônicas diante da transição política latino-americana

    Recepção: 14 de maio de 2020

    Aceitação: 13 de agosto de 2020

    Sumário

    O artigo a seguir busca reagir ao estudo de Joanildo Burity, intitulado "El pueblo evangélico: construcción hegemónica, disputas minoritarias y reacción conservadora", que trata da construção da "política evangélica" a partir das noções de "povo" e "lógica populista", a partir da obra de Ernesto Laclau. O objetivo é destacar a relevância de sua contribuição para a ressignificação de algumas matrizes de análise sobre a identidade evangélica e sua relação com o espaço público. Para tanto, a proposta de Burity será complementada com o uso de outras categorias dentro do próprio arcabouço de Laclau, juntamente com as contribuições da produção do Cone Sul sobre o campo evangélico.

    Palavras-chave: , , , ,

    o evangélico como força agonística: disputas hegemônicas em face da transição política latino-americana

    O artigo a seguir procura reagir ao estudo de Joanildo Burity, intitulado "O povo evangélico: construção hegemônica, disputas minoritárias e reação conservadora", sobre a construção da "política evangélica" a partir das noções de "povo" e de "lógica populista" da obra de Ernesto Laclau. O objetivo é destacar a relevância de sua contribuição para ressignificar algumas matrizes de análise sobre a identidade evangélica e sua relação com os espaços públicos. Para tanto, a proposta de Burity será complementada com o uso de outras categorias dentro do mesmo arcabouço laclauano, complementando com contribuições da produção no Cone Sul sobre o campo evangélico.

    Palavras-chave: Campo evangélico, lógica populista, agonismo, identidade, política.


    A crescente visibilidade dos grupos evangélicos na esfera pública tem suscitado, como nunca antes, um forte interesse em tentar compreender o fenômeno representado pelo lugar que esse setor religioso vem conquistando dentro da ziguezagueante dinâmica social da América Latina. Esse reposicionamento do evangelicalismo nos novos cenários do campo político regional tem colocado em tensão algumas das visões e conceitualizações instaladas no campo, especialmente as que se referem à secularidade, à secularização, ao pluralismo religioso, entre outras. Quem são "os evangélicos"? De onde eles vêm? Como eles alcançaram tanto poder? Essas são perguntas frequentes e que demonstram não apenas o interesse em discernir essas dinâmicas, mas também os preconceitos, as generalizações e até mesmo a falta de precisão na hora de respondê-las.

    O texto de Joanildo Burity, "El pueblo evangélico: construcción hegemónica, disputas minoritarias y reacción conservadora", nos ajuda a analisar criticamente várias abordagens da relação entre o campo evangélico e a política. Baseando-se na abordagem de Ernesto Laclau sobre a construção de identidades sociais com base no populismo como uma lógica política (Laclau, 2005), Burity emprega dois elementos significativos para destacar em relação às maneiras pelas quais o campo evangélico é analisado. Primeiro, a identidade evangélica está longe de ser um núcleo categórico com características fixas; ao contrário, ela inscreve a conjunção de um aglomerado de expressões, narrativas, práticas e determinações, muitas delas antagônicas. O autor especifica que a diversidade de memórias relacionadas ao evangélico não deve ser interpretada apenas como emanações de um "centro irradiador", mas deve ser entendido que "o evangélico" incorpora um significante constitutivamente aberto e internamente dividido. Isso quer dizer que a pluralidade evangélica não descreve simplesmente uma diversidade estrutural externa, mas uma caracterização constitutiva do evangélico propriamente dito como uma identidade internamente fissurada. Em termos laclausianos (Laclau, 2005: 64), o campo evangélico é construído a partir de um borda interna que articula diversas cadeias equivalenciais que possibilitam constantes deslocamentos internos e, ao mesmo tempo, instituem instâncias de junção com outros sujeitos sociais.

    A partir deste último, o segundo elemento importante que Burity enfatiza é que não há telos (histórica ou fenomenológica) na ação política evangélica, como pode ser visto em uma frase como "os evangélicos estão entrando na política", que é muito popular. Essa máxima, na realidade, expressa não apenas uma imagem homogeneizadora da mobilização desse setor, mas também uma visão corporativista e institucionalista de sua ação política.

    A Burity apresenta o conceito de minorização (um termo emprestado de Connolly, 2008) para explicar dois tipos de configuração que instituem a ação política evangélica: uma rede de modos de institucionalização (organizações, igrejas, grupos, indivíduos) e um lógica contra-hegemônica Em outras palavras, as matrizes de mobilização evangélica não são análogas, mas respondem a dinâmicas de articulação baseadas nos diversos agentes e discursos que habitam e circulam no campo. Em outras palavras, as matrizes de mobilização evangélica não são análogas, mas respondem a dinâmicas de articulação baseadas nos diversos agentes e discursos que habitam e circulam no campo. Os grupos evangélicos entram no espaço público com o objetivo de obter reconhecimento e legitimidade como atores sociais, além de disputar a hegemonia em torno de significantes como "o povo", "a nação", "a política", "a moral", entre outros.

    Esses dois elementos da proposta de Burity contrastam, como já mencionamos, com alguns dos lugares comuns em que caem certas análises acadêmicas, jornalísticas e políticas do campo evangélico, a saber a ideia de uma identidade religiosa homogênea (que ignora sua ampla diversificação interna) e um tipo de identificação política limitada à influência em espaços de poder institucional, associada a uma ideologia conservadora e de direita (que também ignora as múltiplas práticas e reapropriações políticas presentes, bem como a tensão entre as bricolagens ideológicas que existem em seu interior).

    Podemos dizer que muitas dessas leituras e propostas analíticas já estavam presentes, de forma incipiente ou a partir de outras âncoras teóricas, nos estudos sobre o campo evangélico no Cone Sul desde suas origens. Lembremos, por exemplo, a nomeação de Matt Marostica (1994), que no início da década de 1990 chamou o campo evangélico de um novo movimento socialO autor argumenta que essa expressão religiosa alcançou então uma forte posição em termos de "identidade cultural", ou seja, como um "espaço de expressão social". Também vemos isso nos estudos de Hilario Wynarczyk (2009, 2010) com o conceito de campo de forçaWynarczyk identifica as tensões e os conflitos dentro do setor evangélico, especialmente entre os dois polos que, segundo esse autor, compõem esse grupo: o liberacionista histórico e o conservador bíblico. Wynarczyk também fala dos grupos evangélicos como movimentos sociais cuja configuração identitária se projeta na transição de um setor excluído das esferas monopolistas sociais e eclesiásticas para a criação de estratégias de ação e visibilidade pública, refletidas na formação de partidos políticos e na sua participação em debates públicos sobre questões socialmente sensíveis, como a revisão do projeto de liberdade religiosa e o registro de cultos na Argentina (Wynarczyk, 2010).

    Da mesma forma, encontramos uma extensa bibliografia que demonstra claramente que as práticas políticas evangélicas são extremamente heterogêneas, onde são identificadas e analisadas as mutações que instituem a ponte entre o religioso e o público (Algranti, 2010; Carbonelli, 2008, 2009, 2011; Carbonelli e Mosqueira, 2010; Frigerio, 1994; Bahamondes e Alarcón, 2013; Burity, 2006, 2008a, 2008b, 2011, 2015, 2016, 2017; Fediakova, 2013; Mansilla e Orellana, 2018; Míguez, 2000; Panotto, 2014, 2016a, 2016b; Parker, 2012; Semán, 2000, 2001, 2010, 2013; Wynarczyk, 2009, 2010, 2014, 2018). Essa produção desenvolve, entre outros aspectos, a diversidade territorial e institucional dos processos de advocacy (setores urbanos e populares; municípios, bairros e estados), a pluralidade de grupos e classes sociais envolvidos, os diferentes tipos de agência (lobby institucional, programas de bairro, filiação partidária, advocacia de organizações da sociedade civil, presença em redes políticas), os vários objetivos estabelecidos (intervenção no tratamento de políticas públicas, abordagem de questões como leis de liberdade religiosa, aumento da visibilidade do lugar social da igreja), os diferentes campos de ação, demanda e reação (secularismo, direitos sexuais e reprodutivos, pluralidade religiosa, estabilidade política e econômica, direitos humanos) e a performances e militância (ou seja, um impacto que vai do institucionalismo a uma ética sociocultural). Tudo isso, por fim, se desdobra em expressões ideológicas muito variadas que habitam e convivem no mesmo coração evangélico: conservadorismo, neoconservadorismo e progressismo, direita e esquerda, além da extensa combinação entre todas elas e, ao mesmo tempo, a existência de muitas expressões que escapam a essas demarcações.

    Se contrastarmos esse amplo espectro de estudos (cobrindo um desenvolvimento de pelo menos quatro décadas) com as imagens, conceitualizações e nomeações predominantemente estereotipadas que encontramos nas análises políticas e jornalísticas atuais, nos perguntamos onde está a lacuna entre as abordagens rigorosas e complexas existentes e as generalizações baseadas em um certo "senso comum" que circula em alguns espaços. Como vários estudiosos têm afirmado em colunas analíticas recentes (Seman e Viotti, 2019; Panotto, 2019; Mosqueira, 2019; Bahamondes, 2020), a falta de análise aprofundada do campo evangélico não só promove imprecisões metodológicas como também formas errôneas de abordar as dinâmicas sociopolíticas, tanto desse grupo em particular como do mundo religioso em geral.

    A partir daqui, é importante focar em duas questões relacionadas a dois eixos subjacentes na proposta de Burity que nos fornecem alguns insumos para abordar essas discrepâncias epistêmicas identificadas, a saber: o impacto das disputas internas no campo evangélico sobre as formas de análise de suas identificações políticas e os fatores em jogo na reapropriação do evangelicalismo pela esfera pública e pelos diversos atores políticos. A primeira é: como a análise da constituição da identidade do campo evangélico pode se tornar mais complexa? Essa questão envolve algo que vem sendo discutido há algum tempo na área dos estudos religiosos e tem a ver com a crítica às formas estáticas de compreensão das identidades crentes baseadas em uma definição essencialista da religião como um conceito sociológico, ou seja, como uma categoria com axiomas determinados e aplicáveis a todos os casos, mas, mais especificamente, que inscreve identificações ontológicas imóveis (Ceriani, 2013). Nesse sentido, "o evangélico" também corre o risco - como de fato acontece repetidamente com seu uso - de ser transformado em uma classificação que homogeneíza coletivos, reduz os tipos de vinculação e circulação entre agentes (internos e externos) e limita sua ação sociopolítica a lugares comuns.

    Isso nos leva ao debate sobre a tensão entre quadros de significação e processos de identificação, ou o que está implícito no uso da categoria de identidade para estudos religiosos (cfr. Asad 1993: 27-54). Alejandro Frigerio (2007) fala sobre a importância de diferenciar entre a identidade pessoal dos indivíduos, suas identidades sociais e a identidade coletiva proposta pelo grupocomo instâncias de interseção que não apenas determinam como o sujeito crente se reapropria do religioso, mas, de fato, como o religioso (e todas as suas irradiações no social, no cultural e no político) se torna uma prática circulante, em vez de uma prática objetivada ou objetificadora. Como afirmou Foucault (2003), não podemos falar de sujeitos em si, mas sim de posições subjetivas que atravessam nossa identidade como um todo heterogêneo e que se manifestam como uma trama que nos divide e, ao mesmo tempo, nos localiza em diferentes territórios, de acordo com as contingências, os espaços, os momentos históricos e as práticas dentro de nossa local socioculturais.

    O mesmo se aplica à religião: esse universo pode ser assumido de múltiplas maneiras por cada sujeito (individual ou coletivo), de acordo com contextos, momentos, processos e contingências. Portanto, no plano evangélico (assim como em toda identificação religiosa), devemos falar do que Benjamin Arditi (2009: 38) chama de planos de identidade metaestáveisAs superfícies interpretativas, ou seja, superfícies interpretativas maleáveis que são legitimadas com base em uma certa densidade histórica e discursiva adquirida ao longo do tempo e que são colocadas em jogo nos processos de identificação. Essas superfícies não simbolizam definições estáticas, mas permitem a circulação de representações até mesmo opostas.

    Dentro do campo evangélico, podemos identificar pelo menos cinco superfícies que entram em jogo nesse processo, a saber: 1) genealogias denominacionais (pentecostal, luterana, batista, entre outras; acrescentando, além disso, diversificações internas); 2) contextos sócio-históricos e ambientais; 3) correntes teológicas (reformada, calvinista, liberacionista, anabatista e todas as vertentes confessionais possíveis); 4) posições político-ideológicas (conservadora, neoconservadora, progressista, evangélica crítica, entre outras); e 5) processos geracionais (enquadrados nas tensões entre diferentes grupos etários e conflitos institucionais sobre adaptação sócio-histórica). Todas essas superfícies se misturam de várias maneiras, pois é impossível correlacionar uma genealogia denominacional com uma corrente teológica ou um contexto sócio-histórico com um posicionamento sociopolítico. Posicionamentos metaestáveis podem existir, mas a partir de tantos pontos nodais quanto suas possíveis combinações. Não é minha intenção sistematizar esses eixos (que são, de fato, muito mais complexos e variados), mas sim destacar que o evangelicalismo diz respeito a uma estrutura identitária que, além das linhas históricas que podemos encontrar (embora, voltando ao início, a oposição original entre a Reforma Magisterial e a Reforma Radical já envolva uma ruptura constitutiva), tem fronteiras difusas, extremamente porosas e completamente flexíveis.

    A isso devemos acrescentar que, quando falamos de setores evangélicos influenciando o espaço público, não podemos simplesmente falar de "a igreja", como se essa institucionalidade - já altamente ambígua e diversa em si mesma - representasse todas as formas de apropriação da influência evangélica. Em outro artigo (Panotto, 2020), apresento a existência de diferentes inscrições institucionais que respondem ao espectro evangélico no espaço público, cada uma delas representando diferentes agentes e tipos de identificação política. Por exemplo, enquanto nos espaços eclesiais os agentes (sujeitos crentes) são extremamente diversos (dependendo da configuração da comunidade) e os tipos de identificação são mais fluidos, plurais e até antagônicos (já que é impossível afirmar que uma igreja local responde a uma única estrutura teológica e posição ideológica), nas Organizações Baseadas na Fé (obf) ou o que poderíamos chamar de Redes Políticas Religiosas (ou seja, organizações regionais ou redes de obf e igrejas cujo objetivo responde a uma agenda de defesa de políticas públicas nacionais ou dentro de organizações multilaterais), nos deparamos com agentes muito mais homogêneos (não apenas leigos ou pastores, mas também crentes profissionais no campo da defesa política, muitos deles com militância partidária específica) e agendas mais concretas, limitadas e ideologicamente direcionadas.

    Seguindo outro termo fundamental da teoria laclausiana sobre a lógica populista (Laclau, 1996: 69-86), o evangélico como estrutura de identificação está longe de ser um local suturado que sustenta sujeitos delimitados. Em vez disso, ele representa um significante vazioEm outras palavras, uma nomeação particular cujo poder de nomeação não reside precisamente em demarcar caracterizações específicas, mas em possibilitar reapropriações flutuantes em termos discursivos, práticos e contextuais dos mais variados tipos, nesse caso, processos de defesa política, identificação com ideologias sociais, releituras a partir de diferentes quadros ideológicos, entre outros.

    A segunda pergunta - falando agora dos fatores que entram em jogo na reapropriação do evangelicalismo pelo espaço público e por diferentes agentes políticos - é a seguinte: por que o "evangelicalismo" adquiriu tanta relevância nas últimas décadas? Em outras palavras, quais são os fatores que levaram ao aumento da visibilidade das comunidades evangélicas nos últimos vinte anos, uma vez que essa expressão religiosa vem ganhando impulso em termos demográficos há várias décadas? Isso se deve apenas a fatores de transformação interna ou extensão numérica, ou há outros componentes subjacentes no contexto atual?

    Para responder a isso, podemos abordar duas outras categorias dentro do arcabouço laclauano: a relação entre demanda e articulação. De acordo com Laclau (2005: 158ss), as demandas são o epicentro da construção de um espaço político. O público não se origina do simples confronto de forças particulares que competem pela legitimidade da identidade (no sentido de uma "guerra de posições" antagônica devido ao simples fato de uma contraposição ideológica), mas sim de demandasAs demandas, ou seja, pontos de insuficiência ou necessidades dentro do campo social mais amplo, que convocam as diferentes vozes e perspectivas que compõem o espectro político com o objetivo de respondê-las. As demandas, além disso, não apenas incorporam necessidades concretas, mas também apontam para deficiências dentro das estruturas simbólicas hegemônicas para ler e lidar com a realidade. Os deslocamentos que ocorrem na esfera social como resultado dessas demandas impulsionam a necessidade de encontrar novas cadeias equivalentes entre os significados e as práticas estabelecidas, com o objetivo de se mobilizar em direção a novas visões de mundo, práticas e modos de institucionalização. Assim, as demandas não implicam uma mudança absoluta na forma como o espaço social e seus agentes são compreendidos, mas mobilizam mudanças que facilitam outras articulações simbólicas e materiais dentro do mesmo espaço.

    Transformando esses elementos no tema que nos interessa, perguntamo-nos: quais foram, então, as demandas que emergiram nos últimos anos e impulsionaram novos deslocamentos tanto no interior do campo evangélico quanto dos agentes e sujeitos sociopolíticos no espaço público, que levaram à construção de novos tecidos com essa expressão religiosa? Burity propõe a hipótese, no caso brasileiro, de que a construção da identidade pentecostal como uma "identidade geral dos protestantes" respondeu a um "efeito agonístico" no contexto da emergência de novas subjetividades políticas no processo pós-ditadura, a partir da década de 1980. Propostas semelhantes podem ser encontradas em outros países (Wynarczyk, 2009; Mansilla e Orellana, 2018).

    Esse fenômeno também pode ser transposto para outros momentos históricos, especialmente para os processos de transformação política regional que ocorreram entre o final da década de 1990 e o início dos anos 2000, principalmente em duas áreas: as reconfigurações profundas do campo religioso (especialmente do monopólio da Igreja Católica) e as mutações nas agendas políticas, com o surgimento de novos governos progressistas. Com relação ao primeiro elemento, a Igreja Católica, embora não tenha perdido sua hegemonia política, tem sido desafiada não apenas pelo crescimento do evangelicalismo, mas também pela perda de confiança social que enfrenta, devido tanto às suas crises internas quanto às tensões que surgiram entre a intransigência da ortodoxia eclesiástica e as demandas sociais emergentes em termos de novos direitos e processos de inclusão. A nova "era Francisco" moveu um pouco esse tabuleiro de xadrez, mas não foi capaz de mudar o curso do deslocamento (Renold e Frigerio 2014).

    Nesse contexto, o campo evangélico emerge como um novo "mediador da religião social", como menciona Burity, diante de um novo conjunto de demandas populares, onde podemos identificar: 1) a necessidade de uma mudança na compreensão do religioso e de seu lugar social, especialmente a partir dos crescentes processos de hibridização, pós-secularização e desinstitucionalização do religioso; 2) uma reconfiguração da dinâmica micropolítica (ou "política cotidiana", como Esteban de Gori a denomina), que responde à crise das visões de mundo e práticas políticas institucionalistas tradicionais, e onde o evangelicalismo responde estrategicamente a partir de sua configuração dinâmica (Semán, 2010); e 3) uma presença e desempenho participação mais efetiva de grupos evangélicos em setores com fortes demandas sociais.

    O segundo elemento a ser destacado nesse contexto de transformação é o impacto da emergência, no espaço público, de novas subjetividades políticas e os debates que isso provocou em torno de demandas e questões como feminismo, diversidade sexual, liberdade religiosa e Estado laico, educação sexual e direitos sexuais e reprodutivos e, com isso, o tratamento dado aos projetos de lei nessas áreas, que foram viabilizados pelos governos nesse período. Isso fez com que vários grupos ligados ao campo evangélico se tornassem mais visíveis, em termos do que José Casanova (1994, 2012) chama de religião públicaO autor descreve três características como: 1) mobilização de grupos religiosos como movimentos sociais, 2) lobby institucional nos níveis local, estadual e federal, e 3) mobilização eleitoral de setores religiosos e possível organização em torno de partidos políticos. Isso levou a um ativismo focado em a moralização da política (Carbonelli, 2008), tanto em termos de uma agenda de valores que confronta essas áreas sensíveis, quanto em termos do que é entendido como um problema constitutivo no espectro político institucional, comumente referido pelo significante "corrupção".

    Como afirma Burity (2016), as lógicas de minorização do campo evangélico - refletidas em estratégias de resistência e envolvimento na arena pública baseadas em lógicas rizomáticas a partir das reviravoltas possibilitadas pela própria institucionalidade política - transformaram "o evangélico" em um significante que articula não apenas uma forma inovadora de experiência religiosa (e seus efeitos na vida social), mas também novas militâncias, formas de reconfigurar a experiência religiosa (e seus efeitos na vida social), transformaram o "evangelicalismo" em um significante que articula não apenas uma forma inovadora de experiência religiosa (e seus efeitos na vida social), mas também uma nova militância, formas de reconfigurar os imaginários sociais (sob a contraposição da universalidade da moralidade contra o "relativismo nocivo" que implica um posicionamento ideológico) e de performances As lideranças carismáticas e personalistas que estão surgindo na região se espelham, em grande parte, nas lideranças políticas carismáticas e personalistas que estão surgindo na região. Assim, poderíamos dizer, a título de exemplo e em consonância com Burity, que o empoderamento dos grupos evangélicos conservadores decorre dos processos de articulação desenvolvidos com a "nova direita" (ou seja, o conjunto de governos que surgiram nos últimos dez anos), como reação à crise dos modelos progressistas que moldavam a política regional, Esses governos se levantaram para se opor às agendas públicas das organizações de direitos humanos e disputar a hegemonia política, e encontraram no campo evangélico um reservatório simbólico para lutar não apenas por projetos e agendas, mas também por lógicas políticas.

    A força com que o surgimento do evangelicalismo se manifesta hoje, portanto, deriva de sua capacidade de abordar um conjunto de demandas sociais em um contexto de agonismo (Mouffe, 2014) manifestado nas tensões que o tratamento de novas agendas sociais despertou na sociedade civil e na classe política. Nesse sentido, é preciso entender que o tratamento dessas agendas não criou necessariamente um movimento pendular em termos de posições na sociedade, mas sim um cenário de profundas tensões, discrepâncias e conflitos que nem mesmo os governos no poder foram capazes de resolver. Por essa razão, vários grupos evangélicos se levantaram como agentes de moralização, reestruturação social e posicionamento político diante de setores adversários, respondendo a esse vácuo de sentido produzido nas formas simbólicas de enunciar e compreender a dinâmica política a partir de discursos e agências hegemônicas, tanto progressistas quanto conservadoras.

    Dessa forma, deram origem à criação de novos discursos, visões de mundo a partir do sagrado, mecanismos de articulação, recursos humanos e estratégias de advocacy para um novo "interlúdio" entre as agendas em tensão, que demandam outras formas de agir politicamente (diante da crise dos imaginários hegemônicos) e outras formas de viver a fé (diante da crise da ortodoxia católica e da emergência de expressões religiosas diversas). Além disso, os diferentes setores evangélicos serviram para se articular com os sujeitos políticos emergentes no contexto da disputa hegemônica, como podemos ver em cada país, a partir de diferentes conjunturas: No Brasil, vemos a chamada "bancada evangélica" de um lado, com uma forte agenda conservadora, junto com os setores monopolistas do país, e a Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito como uma vertente crítica e progressista; na Argentina, os governos priorizaram qual federação evangélica abordar de acordo com sua agenda política: enquanto os governos kirchneristas estiveram mais próximos da Federación Argentina de Iglesias Evangélicas (faie), que reúne comunidades mais abertas com perspectivas inclusivas e de direitos humanos, o governo Macrismo tinha uma relação mais próxima com a Aliança Cristã de Igrejas Evangélicas da República Argentina (Alianza Cristiana de Iglesias Evangélicas de la República Argentina (acieraNo Chile, o espectro de partidos políticos está ligado a grupos evangélicos pela rejeição ou aprovação do processo constitucional, dependendo de sua agenda específica.

    Para concluir, poderíamos dizer que, nesse período, não é mais possível falar apenas de formas reativo de fazer política dentro do campo evangélico, como formas de disputar e se opor ao surgimento de outras agendas políticas opostas às matrizes morais históricas (cf. Vaggione, 2005). Em vez disso, devemos falar de processos muito mais complexos e profundos, em que as fronteiras antagônicas não são mais apenas demarcadas, mas em que a construção de um novo ethos socioculturais e morais, relacionados, por exemplo, ao que Burity menciona em seu artigo sobre a tradução de um projeto nacional promovido pela Igreja Universal do Reino de Deus no Brasil, proposto mais especificamente por seu líder, Edir Macedo. Daí a relevância de se falar em um política agonistaA ideia de uma estrutura que vai além da inscrição de antagonismos amigo-inimigo, mas sim, como diz Burity com referência à ideia de momento populista (Mouffe 2018: 23-39), de uma lógica que evidencia a bifurcação dentro do próprio espectro evangélico e seus possíveis desdobramentos em termos de disputa hegemônica sobre demandas constitutivas da sociedade: a nação, o povo, a ordem social, a educação, a família, entre muitos outros.

    Isso questiona a existência de um caminho unidirecional do desempenho política evangélica. São múltiplas vozes e orientações, que, por sua vez, possibilitam uma diversidade de modos de articulação política no campo social, com um espectro extremamente amplo de sujeitos, ideologias, conjunturas históricas e projetos sociopolíticos. Aqui reside, portanto, a importância de tornar mais complexa a abordagem da configuração interna do evangelicalismo, de modo a compreender que sua relevância política não advém de um contra-ataque em bloco a um conjunto particular de discursos ou agentes, mas de sua capacidade de articulação, hibridismo, fluidez e maleabilidade para viabilizar e catalisar, a partir do significado polivalente que constitui o "evangelicalismo", diferentes demandas, práticas e construções identitárias antagônicas.

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    Nicolas Panotto é formado em Teologia (iu isedet), Mestrado em Antropologia Social e Política e Doutorado em Ciências Sociais (flacso Argentina). Pesquisador Associado do Instituto de Estudos Internacionais (inte) da Universidad Arturo Prat, Chile. Diretor do Grupo de Estudos Multidisciplinares sobre Religião e Incidência Pública (gemrip). Especialista nas áreas de religião e política, campo evangélico latino-americano e teologia pública. Autor de Fé que é tornada pública (2019), Descolonização do conhecimento teológico latino-americano (2018), Religiões, política e o estado secular na América Latina (2017), Religião, política e pós-colonialidade na América Latina (2016), entre outros. orcid: 0000-0002-0513-7175

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