O fio da memória

    Recebido em: 28 de agosto de 2017

    Aceitação: 7 de setembro de 2017

    Sumário

    Durante três meses, foi realizada uma turnê pelo México com a exposição intitulada Tecendo com o fio da memória: pontos de dignidade em meio à guerraA exposição exibiu o trabalho de um coletivo de tecelãs colombianas formado por mulheres sobreviventes do conflito armado. Por meio da tecelagem, elas contaram suas histórias, denunciando as injustiças e a violência que sofreram. A exposição foi compartilhada com grupos de tecelãs da Cidade do México, Guerrero e Chiapas; ao mesmo tempo, foram realizadas oficinas de tecelagem e memória e uma exposição audiovisual. O fio da memória é um documentário que acompanha a jornada da exposição pelo México, refletindo sobre as pontes que são tecidas entre a criação coletiva, a criatividade e o potencial de transformação da realidade dos espaços compartilhados para contar e tecer.

    Palavras-chave: , , , ,

    Os fios da memória

    Uma exposição intitulada Weaving Tricotando os Fios da Memória: Pontos de Dignidade, Cercados pela Guerra O projeto "A Colômbia e o Futuro" percorreu o México durante três meses e apresentou o trabalho de um coletivo de tricoteiras colombianas, todas mulheres que sobreviveram a experiências de conflito armado. Por meio do tricô, elas contaram suas histórias e denunciaram as injustiças e a violência que sofreram. A exposição foi apresentada a grupos de tricoteiras na Cidade do México e nos estados de Chiapas e Guerrero; houve oficinas simultâneas de tricô e memória, além de uma apresentação audiovisual. O fio da memória é um documentário que acompanha a turnê do espetáculo no México, em uma reflexão sobre os vínculos entre a criação coletiva, a criatividade e o potencial transformador da realidade dentro dos espaços que compartilhamos para tricotar e contar histórias.

    Palavras-chave: antropologia visual, tricô, memória, narrativas têxteis, metodologias criativas.

    A T tecelagem não é apenas um passatempo, nem uma atividade doméstica realizada por mulheres; é um reflexo do pensamento, um mantra repetitivo que convida à abstração e à autodescoberta.

    A tecelagem é uma forma de escrita, uma linguagem, um instrumento que reflete a identidade do criador; é um dispositivo de comunicação, uma atividade que libera, cura e torna diferente a concepção do tempo.

    O fio da memória é um documentário que faz parte de uma série de cinco curtas-metragens que realizei como parte de minha tese de doutorado, intitulada "Weaving and resisting. Etnografias audiovisuais e narrativas têxteis entre tecelões de Amuzga no estado de Guerrero e tecelões de memória na Colômbia". Essa pesquisa se concentrou nos diálogos estabelecidos entre a antropologia visual, a memória e os processos de criação coletiva, fundindo assim diversas perspectivas que me permitiram entender a tecelagem, entre outras coisas, como uma metáfora que serviu para explicar o ambiente social e dar sentido ao mundo. Essa metáfora tem sido usada, por exemplo, por antropólogos e sociólogos para explicar a teia de relacionamentos que os indivíduos tecem para formar redes; ela também é usada na biologia para falar de tecido como a coleção organizada de células. Mesmo em alguns idiomas, o conceito de tecelagem é análogo ao ato de pensar, como entre os índios Kogi da Colômbia. No meu caso, entender a tecelagem não apenas como antropólogo, mas também como tecelão, foi duplamente revelador, pois me permitiu concebê-la como uma atividade que promove a criação de um senso de comunidade e, consequentemente, dignifica e capacita seus praticantes. Ela também fortalece os laços de solidariedade e nos permite ver, além da metáfora, como o tecido social está sendo tecido.

    Para entender essa abordagem, era necessário saber tecer, porque somente por meio da experiência com o corpo, vivenciando os efeitos da tecelagem em nosso cérebro e em nossas emoções, é possível entender como essa atividade também tem um impacto no social. É preciso pegar um fio, uma agulha de crochê, um tear ou agulhas e começar a tricotar para se deixar envolver pelo efeito singular do tricô em nosso corpo e em nosso ambiente; portanto, parti da minha experiência como tricoteira, experimentando com meu corpo os efeitos curativos e reflexivos que essa atividade me proporcionava, especialmente quando a realizava junto com outras pessoas.

    Percebi que a tecelagem coletiva gera espaços em que não são apenas tecidos fios: são tecidas histórias, afetos, ideias, resistências e soluções. São levantados cenários, problemas sociais e necessidades individuais. A tecelagem cria um espaço de socialização em que a criatividade emerge e dá origem à reflexão para influenciar o público político; ou seja, oferece a possibilidade de enunciar e tornar visível a dor dos outros para se tornar sensível a ela e, é claro, desenvolver a capacidade de resiliência.

    Um dos objetivos era incentivar a capacidade de reflexão pessoal e coletiva dos tecelões da Amuzga para considerar os têxteis em suas dimensões simbólicas, narrativas, afetivas e criativas. A contribuição dessa abordagem foi oferecer a possibilidade de gerar pensamentos e ideias compartilhados sobre a tecelagem e sua capacidade transformadora.

    Essa preocupação, inicialmente pessoal, transformou-se em uma experiência coletiva e tornou-se uma pesquisa colaborativa na qual foram integrados outros conhecimentos afetivos, sensoriais-corporais, narrativos, manuais e criativos do trabalho de tecelagem.

    A proposta metodológica baseou-se em oficinas, uma exposição e a realização de cinco documentários em vídeo. Essas estratégias se tornaram uma forma alternativa de fazer etnografia experimental para entender o trabalho têxtil em diferentes contextos e também para criar vínculos e redes entre tecelões de outras latitudes e para compartilhar, por meio de suas tecelagens, seus próprios processos sociais como mulheres e tecelões organizados em cooperativas têxteis. Esse foi o caso do intercâmbio que facilitei entre tecelões de Chiapas, Guerrero e Colômbia, que deu origem à criação do documentário O fio da memória.

    Juntamente com minha colega colombiana Isabel González, promovi um intercâmbio de trabalhos têxteis entre os tecelões colombianos e alguns coletivos de tecelagem no México, especialmente com os tecelões de Amuzga, no estado de Guerrero, com os quais realizei um trabalho de campo. Entretanto, o intercâmbio também se estendeu às experiências de tecelões urbanos, como o coletivo Bordando por la Paz y la Memoria: una víctima un pañuelo, bem como a Escuela de Artes y Oficios Emiliano Zapata, no bairro de Santo Domingo, na Cidade do México. Por outro lado, houve também um importante intercâmbio com um grupo de tecelões de Zinacantán, em Chiapas, que formam o coletivo Malacate Taller Experimental Textil..

    A experiência cristalizada no presente documentário consistiu na montagem de uma exposição intitulada Tecendo com o fio da memória: pontos de dignidade em meio à guerraA exposição mostrou o trabalho do coletivo Costurero por la memoria, de Sonsón, Colômbia, formado por mulheres sobreviventes do conflito armado, que, por meio de sua tecelagem, começaram a denunciar as injustiças e histórias de violência e conseguiram torná-las visíveis usando a tecelagem como suporte narrativo.

    Durante três meses, de novembro de 2014 a janeiro de 2015, a exposição percorreu os espaços mencionados acima, com a ideia de compartilhar a experiência com outros coletivos têxteis, tecelões e o público em geral. Paralelamente à exposição, ministramos oficinas sobre "Tecelagem e Memória" e organizamos uma exposição audiovisual sobre o mesmo tema.

    Durante toda a jornada, minha câmera acompanhou todo o processo. O documentário consegue resgatar os momentos de maior sensibilidade e empatia com os espectadores e participantes das oficinas. A intenção principal era retribuir a confiança e o esforço dos tecelões colombianos ao nos enviar suas peças tecidas e compartilhar suas histórias profundamente dolorosas. Por meio do vídeo, eles puderam apreciar o impacto e a ressonância que a exposição teve sobre os tecelões mexicanos e a sociedade civil em geral que tiveram a oportunidade de assistir à exposição ou participar dos workshops.

    Ao final de nossa turnê de três meses pelo México com a exposição, já havíamos criado muitos vínculos e redes entre as pessoas. O documentário, como um fio condutor, narra e mostra a reação das pessoas à exposição e descreve o trabalho de cada um dos coletivos que visitamos. Ele também reflete sobre as pontes que são tecidas entre a criação coletiva, a criatividade e a expressão como formas de curar e aprimorar a natureza transformadora dos espaços para criar, narrar e tecer.

    De certa forma, esse documentário é uma espécie de resumo ou síntese da pesquisa de doutorado, reunindo diversas experiências sobre têxteis e o ato de tecer. Ele foi o meio e o suporte que transportou as mensagens entre os tecelões e, em geral, é um retrato das múltiplas apropriações possíveis que podem ser geradas em torno da tecelagem.

    A criação dos cinco vídeos documentários significou mais do que um refúgio para não me perder entre as histórias de outros tecelões; foi uma oportunidade de experimentar, exercitar meu olhar, desenvolver meu próprio estilo para tecer minha jornada etnográfica com imagens. Terminei a pesquisa com uma tecelagem de imagens que dão conta da experiência vivida no encontro intercultural em que diversas subjetividades e experiências convergiram em torno da tecelagem.

    Abaixo, compartilho links para os outros quatro documentários que acompanham a pesquisa e que permitirão uma maior compreensão do histórico da tecelagem como um princípio libertador, curativo, conscientizador e transformador.

    Outros vídeos

    Tecendo para não esquecer

    Escrevendo no tear

    Teares de som

    A flor de Xochistlahuaca

    Especificações técnicas

    Diretor: Mariana Rivera

    Ano: 2015

    Duração: 20 minutos

    País: México

    Formato: HD

    Design de som: Josué Vergara

    Música: Natalia Magliano e Leticia Servín

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