Entrevista com Claudio Lomnitz. Segunda parte: o antropólogo criativo

Recepção: 11 de junho de 2024

Aceitação: 26 de junho de 2024

Esta entrevista corresponde à segunda parte da conversa com o professor Claudio Lomnitz, que ocorreu em 19 de abril de 2023. No mundo acadêmico, Lomnitz é reconhecido por seus livros, que tratam de temas importantes para pensar a cultura nacional a partir de perspectivas antropológicas e históricas, como o nacionalismo, o poder cacique regional, a cultura mexicana da morte, a fronteira com os Estados Unidos, a violência e a religião, bem como temas íntimos, como seu próprio legado familiar baseado em uma genealogia diaspórica.

Não é fácil circunscrever Claudio em uma única disciplina; embora ele seja altamente reconhecido como antropólogo (méritos que o levaram a se tornar o atual diretor do Departamento de Antropologia da Universidade de Columbia, em Nova York), ele também foi credenciado como historiador em 2021, quando foi nomeado membro da Academia Mexicana de História. Além disso, Claudio é um dos poucos antropólogos que tem prestígio fora do ambiente universitário, devido ao seu trabalho como colunista do jornal La Jornada e às suas publicações de ensaios mensais na revista links. Em várias ocasiões, Lomnitz disse que os acadêmicos deveriam ser intelectuais com a capacidade de influenciar a sociedade. Seu apelo evoca o passado glorioso da antropologia mexicana que, com Manuel Gamio, passou a ter grande influência no projeto de construção nacional. Embora hoje a antropologia tenha perdido sua presença na tomada de decisões e esteja longe de conseguir transformar seus livros em uma ferramenta para influenciar a sociedade. mais vendidosClaudio se baseia na validade da antropologia para pensar e encontrar maneiras de sair do labirinto que aprisiona a cultura e a sociedade contemporâneas. E, como se isso não bastasse, Lomnitz também se aventurou em áreas das artes cênicas que estendem as fronteiras do meio acadêmico.

A primeira parte da entrevista abordou suas principais contribuições para a pesquisa. Seus livros foram discutidos e Claudio compartilhou conosco as influências que teve em seu pensamento. Nesta segunda parte da entrevista, dois tópicos menos conhecidos de sua trajetória são discutidos. O primeiro tem a ver com sua incursão como roteirista em duas peças musicais. Alberto Bulnes e A grande famíliaque ele criou junto com seu irmão Alberto.

Durante a entrevista, o tema da criatividade, presente na carreira de Lomnitz, é destacado. Embora saibamos que ela é necessária não apenas na fase de divulgação científica, mas também para conceber novos temas e questões arriscadas, devemos reconhecer que se trata de um assunto complexo que, como disse Jesús Martín Barbero, nos leva a navegar em mares escuros sem mapas para descobrir novos mares. Abordamos o tema da criatividade. Na entrevista, ele falou sobre seu gosto pela música, pelas artes e pelo teatro. O que a criatividade pode contribuir para a tarefa de suavizar o poder, para imaginar novos mundos possíveis, o que pode ser feito para a sociedade e para a academia a partir de produções criativas e artísticas, ou, melhor dizendo, como estabelecer essas interseções entre o pensamento crítico e a arte sem, por um lado, perder o rigor científico e, por outro, sem dissecar o espírito criativo da imaginação, ou torná-lo chato como o inferno? Mais facilmente, como conciliá-los? Essas perguntas abriram as reflexões e respostas de Lomnitz.

Em sua conversa, ele nos permite reconhecer os medos que teve ao se aventurar em um meio no qual a dramatização é fundamental e o contexto, tão importante para o ofício do antropólogo e do historiador, é obscurecido. Tenho certeza de que essa parte reflexiva sobre seus próprios medos e, ao mesmo tempo, sobre o novo escopo oferecido ao sair do ambiente acadêmico para outros cenários, será de grande interesse para nossos leitores do Encartes. A popularização da ciência nos atrai com a possibilidade de socializar e ampliar o público para o conhecimento produzido nas universidades. É a maneira de dar vida aos nossos esforços. Mas também corre o risco de trivializar ou até mesmo enfraquecer o rigor com que descrevemos em livros as descobertas de uma ciência baseada em métodos experimentais em grande detalhe.

O tema de sua identidade diaspórica também foi abordado para refletir sobre as características que imprime em sua forma de pensar e produzir conhecimento, sempre fora do lugar "original", mas ao mesmo tempo sempre refundando e estabelecendo bases. Qual é a importância de colocar o México no currículo e na academia norte-americana? Como nós, mexicanos, devemos pensar em nós mesmos em relação aos Estados Unidos e os norte-americanos em relação ao México?

A última parte da entrevista trata de seu recente livro O jurista e o antropólogo: conversas por curiosidade (2022), em que a antropologia conversa com o jurista José Ramón Cossío. O tema central gira em torno do reconhecimento de como todos entendem, interpretam e nomeiam de forma tão diferente o mesmo mundo em que vivemos. Neste ensaio dialógico, Claudio sai dos limites habituais das disciplinas acadêmicas e profissionais para transgredir as fronteiras do conhecimento. Uma das questões mais desafiadoras é como pensar a família contemporânea e os desafios de como legislar suas múltiplas concretizações a partir da esfera jurídica.

Tive a oportunidade de perguntar a ele sobre a importância de reconhecer não apenas a validade do conhecimento especializado, mas principalmente a ignorância mútua do outro para alcançar o conhecimento dialógico. O que a antropologia tem a aprender com o mundo jurídico e o que a antropologia tem a ensinar aos advogados para que eles legislem de forma diferente ou entendam o direito? Acredito que suas reflexões fornecem uma pista importante para metodologias dialógicas e horizontais que exigem o despojamento da pretensão acadêmica de saber tudo, bem como a coragem de aceitar a ignorância como fonte de curiosidade para conhecer o outro. Em suas reflexões, você encontrará uma mudança de atitude que parece necessária para ampliar o conhecimento acadêmico.

Para encerrar a entrevista, Claudio compartilha conosco os desafios contemporâneos da antropologia e dos estudiosos socioculturais em geral.

Bibliografia

Lomnitz, Claudio (2022). El jurista y el antropólogo. Conversaciones desde la curiosidad. México: Penguin Random House.


Renée de la Torre possui um Ph.D. em Antropologia Social pela Universidade de ciesas e a Universidade de Guadalajara. Membro da sni nível iii e da Academia Nacional de Ciências. Ela é professora de pesquisa na ciesas Occidente, em Guadalajara, México. Ela é cofundadora da Rede de Pesquisadores do Fenômeno Religioso no México (rifrem). Durante sua carreira de pesquisador, dedicou-se ao estudo da diversidade religiosa no México; ao estudo de novos movimentos religiosos; ao surgimento de espiritualidades alternativas, como a Nova Era e a neo-mexicana e, mais recentemente, investigou a dinâmica da transnacionalização das danças rituais astecas e da religiosidade popular. Ele realizou mais de uma dúzia de exposições de fotografias etnográficas. Suas publicações mais recentes incluem o livro Variações latino-americanas da Nova Era. ciesas, México (2013), traduzido para o inglês Nova Era na América Latina. Variações populares e apropriações étnicasBrill (2016). Ela é autora de Ultra-Baroque Catholicism: Multiplied Images and Decentered Religious Symbols [Catolicismo ultrabarroco: imagens multiplicadas e símbolos religiosos descentralizados]. Bússola Social (2016); e coautor dos seguintes artigos: "Routes et sens postcoloniaux de la transnationalisation religieuse". Nível Mundial (2016); Estudos religiosos na América Latina. Revisão Anual de Sociologia(2016); "The temazcal: a pre-Hispanic ritual transculturalised by alternative spiritual networks" [O temazcal: um ritual pré-hispânico transculturalizado por redes espirituais alternativas]. Ciências Sociais e Religião (2016), e "Religion and Rescaling: How Santo Toribio Put Santa Ana on the Global Religious Map" (Religião e redimensionamento: como Santo Toribio colocou Santa Ana no mapa religioso global). Sociologia atual (2016). orcid: https://orcid.org/0000-0003-3914-4805

Claudio Lomnitz trabalha com antropologia de sociedades nacionais, experimentando vários gêneros de escrita, de ensaios sociológicos a dramas, de narrativas históricas a jornalismo. Autor de mais de uma dúzia de livros. Lecionou em universidades no México e nos Estados Unidos, e foi professor visitante em universidades européias e latino-americanas. Atuou como diretor do Centro de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Chicago, do Centro de Estudos Históricos da New School for Social Research, em Nova York, e do Centro de Estudos de Etnia e Raça da Universidade de Columbia, onde fundou e dirige o Centro de Estudos Mexicanos. Ele é professor titular de Antropologia na Universidade de Columbia.

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